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7 de agosto de 2009

QUANDO O AMOR FAZ MAL À SAÚDE: OBESIDADE FEMININA E EROTOMANIA (parte 1 de 5)

1. Obesidade: sintoma ou solução?

Defendo a tese de que, do ponto de vista psicanalítico, a obesidade não é uma formação simbólica, ou seja, não é um sintoma1. No sentido freudiano, o sintoma é um enigma que divide o sujeito, é uma solução de compromisso entre o desejo sexual e uma exigência da realidade que se lhe opõe. O sintoma surge como uma mediação de um conflito psíquico, sendo, portanto, uma formação simbólica que visa conciliar tendências psíquicas opostas e tem a sua fonte num desejo sexual proibido, recalcado. Nesse sentido, o sintoma se escreve no corpo como uma mensagem que se enlaça a uma satisfação sexual disfarçada, não reconhecida como tal.

Tomar a obesidade como uma solução significa pensá-la como tratamento de um gozo que não pôde ser tratado pela via da sexualidade e, ou seja, pela via do inconsciente. A obesidade, portanto, não é uma formação simbólica, não se trata de uma formação do inconsciente. Não é um saber a decifrar, mas algo que se exibe, se mostra e não diz nada. A obesidade é uma solução, o tratamento de um gozo que envolve a recusa da sexualidade e do inconsciente.

Nos casos de mulheres obesas crônicas e obesas mórbidas que entrevistamos, não há mal estar sexual. O parceiro sexual, quando existe, não é a fonte do conflito, da divisão, ou do mal estar. Essas mulheres até relatam problemas conjugais ou dificuldades nos relacionamentos amorosos. Entretanto, estes sujeitos não localizam o seu incômodo, o seu mal estar na vida sexual. O desencontro sexual não as divide, não é disso que elas sofrem. Tampouco vêem qualquer relação entre o excesso de peso e o eventual mal estar na sexualidade. Nessas entrevistas, observei que essas mulheres entendem o casamento de modo semelhante a uma relação mãe e filho.

Quanto à parceria amorosa, encontramos, nessas mulheres, as seguintes situações:

1. Mulheres que jamais fizeram um vínculo conjugal com um homem ou que tiveram relações esporádicas, precárias, com homens, mas mantêm, inalterada, a sua parceria com a mãe, morando, muitas vezes, na mesma casa. O importante nas suas vidas é a relação amorosa com a mãe, mantendo-se na posição de filhas.

2. Mulheres que realizam um casamento, tiveram filhos, mas a relação conjugal, sexual, desaparece, diminui de importância perante a sua função como mãe. São mulheres que se dedicam aos filhos e estabelecem, com eles, a relação amorosa mãe e filho.

3. Mulheres que têm um parceiro conjugal, mas jamais se afastaram de suas mães. O homem parece, nestes casos, um acessório na relação libidinal mãe e filha. Em alguns casos, ele é transformado em filho também pela família da mulher.

O laço social destas mulheres é parasitado pelo modelo da relação amorosa mãe – filha. Uma entrevistada me disse, certa vez, muito surpresa com uma observação minha, que jamais se separaria de sua mãe, que ela é a sua melhor amiga e que mãe é para sempre. Ou seja, não se deixa, jamais, a posição de filha e a expectativa é a de tudo receber da mãe. Numa outra perspectiva, mas na mesma lógica, encontramos mulheres que dão tudo aos filhos, ao marido, aos parentes etc. Elas são cativas de uma doação e de um amor inesgotáveis.

Resumindo, podemos dizer que essas mulheres são “cheias de amor”. A observação destes casos levanta a questão da relação entre o amor e o sexo na sexuação feminina, que passarei a desenvolver seguindo as coordenadas do último ensino de Lacan conjugadas com as fórmulas da sexuação apresentadas por ele no Seminário 20 (Lacan, 1985).

...............................................................Continua...

Artigo de Maria Cristina Antunes
http://www.nucleosephora.com/asephallus/numero_03/artigo_08port_edicao03.htm

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